REZANDO COM O EVANGELHO DO DIA
(LECTIO DIVINA)
Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm.
Terça-feira da 33ª Semana do Tempo Comum
1) Oração
Senhor nosso Deus, fazei que a
nossa alegria consista em vos servir de todo o coração, pois só teremos
felicidade completa, servindo a vós, o criador de todas as coisas. Por nosso
Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.
2) Leitura do Evangelho (Lucas 19,1-10)
Naquele tempo, 1Jesus entrou em Jericó e ia atravessando a
cidade. 2Havia aí um homem muito rico chamado Zaqueu, chefe dos
recebedores de impostos. 3Ele procurava ver quem era Jesus, mas não
o conseguia por causa da multidão, porque era de baixa estatura. 4Ele
correu adiante, subiu a um sicômoro para o ver, quando ele passasse por ali. 5Chegando
Jesus àquele lugar e levantando os olhos, viu-o e disse-lhe: Zaqueu, desce
depressa, porque é preciso que eu fique hoje em tua casa. 6Ele
desceu a toda a pressa e recebeu-o alegremente. 7Vendo isto, todos
murmuravam e diziam: Ele vai hospedar-se em casa de um pecador... 8Zaqueu,
entretanto, de pé diante do Senhor, disse-lhe: Senhor, vou dar a metade dos
meus bens aos pobres e, se tiver defraudado alguém, restituirei o quádruplo. 9Disse-lhe
Jesus: Hoje entrou a salvação nesta casa, porquanto também este é filho de
Abraão. 10Pois o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava
perdido. - Palavra da salvação.
3) Reflexão
* No
evangelho de hoje, estamos chegando ao fim da longa viagem que começou no
capítulo 9 (Lc 9,51). Durante a viagem, não se sabia bem por onde Jesus andava.
Só se sabia que ele ia em direção a Jerusalém. Agora, no fim, a geografia fica
clara e definida. Jesus chegou em Jericó, a cidade das palmeiras, no vale do
Jordão. Última parada dos peregrinos, antes de subir para Jerusalém! Foi em
Jericó, que terminou a longa caminhada do êxodo de 40 anos pelo deserto. O
êxodo de Jesus também está terminando. Na entrada de Jericó, Jesus encontrou um
cego que queria vê-lo (Lc 18,35-43). Agora, na saída da cidade, ele encontra
Zaqueu, um publicano, que também queria vê-lo. Um cego e um publicano. Os dois
eram excluídos. Os dois incomodavam o povo: o cego com seus gritos, o publicano
com seus impostos. Os dois são acolhidos por Jesus, cada um a seu modo.
* Lucas 19,1-2: A situação
Jesus
entrou em Jericó e atravessava a cidade. "Havia
ali um homem, chamado Zaqueu, muito rico, chefe dos publicanos". Publicano era a pessoa que cobrava o
imposto público sobre a circulação da
mercadoria. Zaqueu era o chefe dos publicanos da cidade. Sujeito rico e muito
ligado ao sistema de dominação dos romanos. Os judeus mais religiosos argumentavam
assim: “O rei do nosso povo é Deus. Por isso, a dominação romana sobre nós é
contra Deus. Quem colabora com os romanos peca contra Deus!” Assim, soldados
que serviam no exército romano e cobradores de impostos, como Zaqueu, eram
excluídos e evitados como pecadores e
impuros.
* Lucas 19,3-4: A atitude de Zaqueu
Zaqueu quer ver Jesus. Sendo pequeno, corre na frente,
sobe numa árvore e aguarda Jesus passar. É muita vontade de ver Jesus!
Anteriormente, na parábola do pobre Lázaro e do rico sem nome (Lc 16,19-31),
Jesus mostrava como é difícil um rico se converter e abrir a porta de separação
para acolher o pobre Lázaro. Aqui aparece o caso de um rico que não se fecha na
sua riqueza. Zaqueu quer algo mais. Quando um adulto, pessoa de destaque na cidade,
trepa numa árvore, é porque já nem liga para a opinião dos outros. Algo mais
importante o move por dentro. Ele está querendo abrir a porta para o pobre
Lázaro.
* Lucas 19,5-7: Atitude de Jesus, reação do povo
e de Zaqueu
Chegando perto e vendo Zaqueu na árvore, Jesus não
pergunta nem exige nada. Apenas responde ao desejo do homem e diz: "Zaqueu, desça depressa! Hoje devo
ficar em sua casa!" Zaqueu desceu e recebeu Jesus em sua casa, com
muita alegria. Todos murmuravam: "Foi hospedar-se na casa de um pecador!"
Lucas diz que todos murmuravam! Isto
significa que Jesus estava ficando sozinho na sua atitude de dar acolhida aos
excluídos, sobretudo aos colaboradores do sistema. Mas Jesus não se importa com
as críticas. Ele vai na casa de Zaqueu e o defende contra as críticas. Em vez
de pecador, o chama de “filho de Abraão” (Lc 19,9).
* Lucas 19,8: Decisão de Zaqueu
"Dou a metade
dos meus bens aos pobres e restituo quatro vezes o que roubei!" Esta é a conversão, produzida em Zaqueu pela acolhida
que Jesus lhe deu. Restituir quatro vezes era o que a lei mandava em alguns
casos (Ex 21,37; 22,3). Dar a metade dos bens aos pobres era a novidade que o
contato com Jesus nele produziu. Era a partilha acontecendo de fato!
* Lucas 19,9-10: Palavra final de Jesus
"Hoje, a
salvação entrou nesta casa, porque ele também é um filho de Abraão!" A interpretação da Lei pela Tradição antiga excluía
os publicanos da raça de Abraão. Jesus diz que veio procurar e salvar o que
estava perdido. O Reino é para todos. Ninguém pode ser excluído. A opção de
Jesus é clara, seu apelo também: não é possível ser amigo de Jesus e continuar
apoiando um sistema que marginaliza e exclui tanta gente. Denunciando as
divisões injustas, Jesus abre o espaço para uma nova convivência, regida pelos
novos valores da verdade, da justiça e do amor.
* Filho
de Abraão.
"Hoje, a
salvação entrou nesta casa, porque ele também é um filho de Abraão!" Através da descendência de Abraão, todas as nações da
terra serão benditas (Gn 12,3; 22,18). Para as comunidades de Lucas, formadas
por cristãos tanto de origem judaica como de origem pagã, a afirmação de Jesus
chamando Zaqueu de “filho de Abraão”, era muito importante. Nela encontravam a
confirmação de que, em Jesus, Deus estava cumprindo as promessas feitas a Abraão,
dirigidas a todas as nações, tanto judeus como gentios. Estes são também filhos de Abraão e herdeiros das
promessas. Jesus acolhe os que não eram acolhidos. Oferece lugar aos que não
tinham lugar. Recebe como irmão e irmã as pessoas que a religião e o governo
excluíam e rotulavam como:
* imorais: prostitutas e pecadores (Mt
21,31-32; Mc 2,15; Lc 7,37-50; Jo 8,2-11),
* hereges: pagãos e samaritanos (Lc
7,2-10; 17,16; Mc 7,24-30; Jo 4,7-42),
* impuras: leprosos e possessos (Mt 8,2-4;
Lc 17,12-14; Mc 1,25-26),
* marginalizadas: mulheres, crianças e
doentes (Mc 1,32; Mt 8,16;19,13-15; Lc 8,2-3),
* pelegos: publicanos e soldados (Lc
18,9-14;19,1-10);
* pobres: o povo da terra e os pobres sem
poder (Mt 5,3; Lc 6,20; Mt 11,25-26).
4) Para um confronto pessoal
1. Como nossa comunidade acolhe as
pessoas desprezadas e marginalizadas? Somos capazes, como Jesus, de perceber os
problemas das pessoas e dar atenção a elas?
2. Como percebemos a salvação entrando
hoje
na nossa casa e na nossa comunidade? A ternura acolhedora de Jesus provocou uma
mudança total na vida de Zaqueu. A ternura acolhedora da nossa comunidade está
provocando alguma mudança no bairro? Qual?
5) Oração final
De todo coração te procuro:
não me deixes desviar dos teus
preceitos.
Conservo no coração tuas promessas
para não te ofender com o pecado.
(Sl 118,10-11)
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