(LECTIO DIVINA)
Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm.
Quarta-feira da 28ª Semana do Tempo Comum
1) Oração
Ó Deus, sempre nos preceda e
acompanhe a vossa graça
para que estejamos sempre
atentos
ao bem que devemos fazer.
Por nosso Senhor Jesus
Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.
2) Leitura do Evangelho (Lucas 11, 42-46)
Naquele tempo disse Jesus: 42Ai de vós, fariseus, que pagais
o dízimo da hortelã, da arruda e de diversas ervas e desprezais a justiça e o
amor de Deus. No entanto, era necessário praticar estas coisas, sem contudo
deixar de fazer aquelas outras coisas. 43Ai de vós, fariseus, que
gostais das primeiras cadeiras nas sinagogas e das saudações nas praças
públicas! 44Ai de vós, que sois como os sepulcros que não aparecem,
e sobre os quais os homens caminham sem o saber. 45Um dos doutores
da lei lhe disse: Mestre, falando assim também a nós outros nos afrontas. 46Ele
respondeu: Ai também de vós, doutores da lei, que carregais os homens com pesos
que não podem levar, mas vós mesmos nem sequer com um dedo vosso tocais os
fardos.
3) Reflexão
* No
Evangelho de hoje continua o relacionamento conflituoso entre Jesus e as
autoridades religiosas da época. Hoje, na igreja acontece o mesmo conflito.
Numa determinada diocese, o bispo convocou os pobres a participar ativamente.
Eles atenderam ao pedido e em grande número começaram a participar. Surgiu um
grave conflito. Os ricos diziam que foram excluídos e alguns sacerdotes
começaram a dizer: “O bispo só faz política e esquece o evangelho!”
* Lucas 11,42: Ai de vocês, que deixam de lado a
justiça e o amor
“Ai de vocês, fariseus, porque vocês pagam o
dízimo da hortelã, da arruda e de todas as outras ervas, mas deixam de lado a
justiça e o amor de Deus. Vocês deveriam praticar isso, sem deixar de lado
aquilo”. Esta crítica de Jesus
contra os líderes religiosos daquela época pode ser repetido contra muitos
líderes religiosos dos séculos seguintes, até hoje. Muitas vezes, em nome de
Deus, insistimos em detalhes e esquecemos a justiça e o amor. Por exemplo, o
jansenismo tornou árida a vivência da fé, insistindo em observâncias e
penitências que desviaram o povo do caminho do amor. A irmã carmelita Santa
Teresa de Lisieux foi criada nesse ambiente jansenista que marcava a França no
fim do século XIX. Foi a partir de uma dolorosa experiência pessoal, que ela
soube recuperar a gratuidade do amor de Deus como a força que deve animar por
dentro a observância das normas. Pois, sem a experiência do amor, as
observâncias fazem de Deus um ídolo.
A observação final de Jesus dizia: “Vocês deveriam praticar isso, sem deixar de
lado aquilo”. Esta advertência
faz lembrar uma outra observação de Jesus que serve de comentário: "Não pensem que eu vim abolir a Lei e
os Profetas. Não vim abolir, mas dar-lhes pleno cumprimento. Eu garanto a
vocês: antes que o céu e a terra deixem de existir, nem sequer uma letra ou
vírgula serão tiradas da Lei, sem que tudo aconteça. Portanto, quem desobedecer
a um só desses mandamentos, por menor que seja, e ensinar os outros a fazer o
mesmo, será considerado o menor no Reino do Céu. Por outro lado, quem os
praticar e ensinar, será considerado grande no Reino do Céu. Com efeito, eu
lhes garanto: se a justiça de vocês não superar a dos doutores da Lei e dos
fariseus, vocês não entrarão no Reino do Céu" (Mt 5,17-20)
* Lucas 11,43: Ai de vocês, que gostam dos
lugares de honra
“Ai de vocês, fariseus, porque gostam do
lugar de honra nas sinagogas, e de serem cumprimentados em praças públicas”. Jesus chama a atenção dos discípulos
para o comportamento hipócrita de alguns fariseus. Estes tinham gosto em
circular pelas praças com longas túnicas, receber as saudações do povo, ocupar
os primeiros lugares nas sinagogas e os lugares de honra nos banquetes (cf. Mt
6,5; 23,5-7). Marcos acrescenta que eles gostavam de entrar nas casas das
viúvas e fazer longas preces em troca de dinheiro! Pessoas assim vão receber um
julgamento mais severo (Mc 12,38-40). Hoje acontece o mesmo na nossa igreja.
* Lucas 11,44: Ai de vocês, túmulos escondidos
“Ai de vocês, porque são como túmulos que
não se vêem, e os homens pisam sobre eles sem saber". Lucas modificou
a comparação. Em Mateus se diz: “Vocês
são como sepulcros caiados: por fora parecem bonitos, mas por dentro estão
cheios de ossos de mortos e podridão! Assim também vocês: por fora, parecem
justos diante dos outros, mas por dentro estão cheios de hipocrisia e
injustiça” (Mt 23,27-28). A
imagem de “sepulcros caiados” fala por si e não precisa de comentário. Por meio
dela, Jesus condena os que mantêm uma aparência fictícia de pessoa correta, mas
cujo interior é a negação total daquilo que querem fazer aparecer para fora.
Lucas fala em sepulcros escondidos: “Ai de
vocês, porque são como túmulos que não se vêem, e os homens pisam sobre eles
sem saber". Quem pisa ou toca num sepulcro torna-se impuro, mesmo
quando o sepulcro existe escondido debaixo do chão. A imagem é muito forte: por
fora, o fariseu de sempre parece justo e bom, mas esse aspecto é um engano,
pois dentro dele existe um sepulcro escondido que, sem o povo se dar conta,
espalha um veneno que mata, comunica uma mentalidade que afasta de Deus, sugere
uma compreensão errada da Boa Nova do Reino. Uma ideologia que faz do Deus vivo
um ídolo morto!
* Lucas 11,45-46: Crítica do doutor da lei e a
resposta de Jesus
“Um especialista em leis tomou a palavra, e disse: "Mestre, falando assim insultas também
a nós!" Na resposta Jesus
não voltou atrás mas deixou bem claro que a mesma crítica valia também para os
escribas: "Ai de vocês também,
especialistas em leis! Porque vocês impõem sobre os homens cargas
insuportáveis, e vocês mesmos não tocam essas cargas nem com um só dedo”.
No Sermão da Montanha, Jesus expressou a mesma crítica que serve de comentário:
“Os doutores da Lei e os fariseus têm
autoridade para interpretar a Lei de Moisés. Por isso, vocês devem fazer e
observar tudo o que eles dizem. Mas não imitem suas ações, pois eles falam e
não praticam. Amarram pesados fardos e os colocam no ombro dos outros, mas eles
mesmos não estão dispostos a movê-los, nem sequer com um dedo” (Mt
23,2-4).
4) Para um confronto pessoal
1) A hipocrisia mantém uma aparência
enganadora. Até onde atua em mim a hipocrisia? Até onde a hipocrisia atua na
nossa igreja?
2) Jesus criticava os escribas que
insistiam na observância disciplinar das coisas miúdas da lei como dízimo da
hortelã, da arruda e de todas as ervas, e esqueciam de insistir no objetivo da
lei que é a prática da justiça e do amor. Vale para mim esta crítica?
5) Oração final
Feliz o homem que não procede conforme o conselho dos
ímpios,
não trilha o caminho dos pecadores,
nem se assenta entre os escarnecedores.
Feliz aquele que se compraz no serviço do Senhor
e medita sua lei dia e noite.
(Sl 1, 1-2)
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