REZANDO COM O EVANGELHO DO DIA
(LECTIO DIVINA)
Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm.
Sábado da 17ª Semana do Tempo Comum
1) Oração
Ó Deus, sois o amparo dos que em vós
esperam
e, sem vosso auxílio,
ninguém é forte, ninguém é santo:
redobrai de amor para
convosco,
para que, conduzidos por
vós,
usemos de tal modo os bens
que passam,
que possamos abraçar os que
não passam.
Por nosso Senhor Jesus
Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.
2) Leitura do Evangelho (Mateus 14,1-12)
1Naquele
tempo, a fama de Jesus chegou aos ouvidos do governador Herodes. 2E
disse aos seus cortesãos: É João Batista que ressuscitou. É por isso que ele
faz tantos milagres. 3Com efeito, Herodes havia mandado prender e
acorrentar João, e o tinha mandado meter na prisão por causa de Herodíades,
esposa de seu irmão Filipe. 4João lhe tinha dito: Não te é permitido
tomá-la por mulher! 5De boa mente o mandaria matar; temia, porém, o
povo que considerava João um profeta. 6Mas, na festa de aniversário
de nascimento de Herodes, a filha de Herodíades dançou no meio dos convidados e
agradou a Herodes. 7Por isso, ele prometeu com juramento dar-lhe
tudo o que lhe pedisse. 8Por instigação de sua mãe, ela respondeu:
Dá-me aqui, neste prato, a cabeça de João Batista. 9O rei
entristeceu-se, mas como havia jurado diante dos convidados, ordenou que lha
dessem;10e mandou decapitar João na sua prisão. 11A
cabeça foi trazida num prato e dada à moça, que a entregou à sua mãe. 12Vieram,
então, os discípulos de João transladar seu corpo, e o enterraram. Depois foram
dar a notícia a Jesus.
3) Reflexão
* O evangelho de hoje descreve como João
Batista foi vítima da corrupção e da prepotência do governo de Herodes. Foi
morto sem processo, durante um banquete do rei com os grandes do reino. O texto
traz muitas informações sobre o tempo em que Jesus vivia e sobre a maneira como
era exercido o poder pelos poderosos da época.
* Mateus
14,1-2. Quem é Jesus para Herodes
O texto começa informando a opinião de
Herodes a respeito de Jesus: "Ele é
João Batista, que ressuscitou dos mortos. É por isso que os poderes agem nesse
homem". Herodes procurava compreender Jesus a partir dos medos que o
assaltavam após o assassinato de João. Herodes era um grande supersticioso que
escondia o medo atrás da ostentação da sua riqueza e do seu poder.
* Mateus 14,3-5: A causa escondida do assassinato de João.
Galiléia,
terra de Jesus, era governada por Herodes Antipas, filho do rei Herodes, o
Grande, desde 4 antes de Cristo até 39 depois de Cristo. Ao todo, 43 anos!
Durante todo o tempo que Jesus viveu, não houve mudança de governo na Galiléia!
Herodes era dono absoluto de tudo, não prestava conta a ninguém, fazia o que
bem entendia. Prepotência, falta de ética, poder absoluto, sem controle por
parte do povo! Mas quem mandava mesmo na Palestina, desde 63 antes de Cristo,
era o Império Romano. Herodes, lá na Galiléia, para não ser deposto, procurava
agradar a Roma em tudo. Insistia sobretudo numa administração eficiente que
desse lucro ao Império. A preocupação dele era a sua própria promoção e
segurança. Por isso, reprimia qualquer tipo de subversão. Mateus informa que o
motivo do assassinato de João foi a denúncia que o Batista fez a Herodes por
ele ter casado com Herodíades, mulher do seu irmão Filipe. Flávio José,
escritor judeu daquela época, informa que o motivo real da prisão de João
Batista era o medo que Herodes tinha de um levante popular. Herodes gostava de
ser chamado de benfeitor do povo, mas na realidade era um tirano (Lc 22,25). A
denúncia de João contra Herodes foi a gota que fez transbordar o copo: "Não te é permitido casar com
ela”. E João foi preso.
* Mateus 14,6-12: A trama do assassinato.
Aniversário e banquete de festa, com danças e orgias!
Marcos informa que a festa contava com a presença “dos grandes da corte, dos
oficiais e das pessoas importantes da Galiléia” (Mc 6,21). É nesse ambiente que
se trama o assassinato de João Batista. João, o profeta, era uma denúncia viva
desse sistema corrupto. Por isso foi eliminado sob pretexto de um problema de
vingança pessoal. Tudo isto revela a fraqueza moral de Herodes. Tanto poder
acumulado na mão de um homem sem controle de si! No entusiasmo da festa e do
vinho, Herodes fez um juramento leviano a Salomé, a jovem dançarina, filha de
Herodíades. Supersticioso como era, pensava que devia manter esse juramento,
atendeu ao capricho da menina e mandou o soldado trazer a cabeça de João num
prato e dar à dançarina, que o entregou à sua mãe. Para Herodes, a vida dos
súditos não valia nada. Dispunha deles como dispunha da posição das cadeiras na
sala.
As três marcas
do governo de Herodes: a nova Capital, o latifúndio e a classe dos
funcionários:
1. A Nova Capital. Tiberíades foi inaugurada quando Jesus
tinha seus 20 anos. Era chamada assim para agradar a Tibério, o imperador de Roma. Lá moravam os donos das terras, os
soldados, a polícia, os juizes muitas vezes insensíveis (Lc 18,1-4). Para lá
eram levados os impostos e o produto do povo. Era lá que Herodes fazia suas
orgias de morte (Mc 6,21-29). Tiberíades era a cidade dos palácios do Rei, onde
vivia o pessoal de roupa fina (cf Mt 11,8). Não consta nos evangelhos que Jesus
tenha entrado nessa cidade.
2. O Latifúndio. Os estudiosos informam que, durante o
longo governo de Herodes, cresceu o latifúndio em prejuízo das propriedades
comunitárias. O Livro de Henoque
denuncia os donos das terras e expressa a esperança dos pequenos: “Então, os poderosos e os grandes já não
serão mais os donos da terra!” (Hen 38,4). O ideal dos tempos antigos era
este: “Cada um debaixo da sua vinha e da
sua figueira, sem que haja quem lhes cause medo” (1 Mac 14,12; Miq 4,4; Zac
3,10). Mas a política do governo de Herodes tornava impossível a realização
deste ideal.
3. A Classe dos
funcionários. Herodes criou toda uma classe de funcionários fieis ao
projeto do rei: escribas, comerciantes, donos de terras, fiscais do mercado,
coletores de impostos, militares, policiais, juizes, promotores, chefes locais.
Em cada aldeia ou cidade havia um grupo de pessoas que apoiavam o governo. Nos
evangelhos, alguns fariseus aparecem junto com os herodianos (Mc 3,6; 8,15;
12,13), o que reflete a aliança entre o poder religioso e poder civil. A vida
do povo nas aldeias era muito controlada, tanto pelo governo como pela
religião. Era necessária muita coragem para começar algo novo, como fizeram
João e Jesus! Era o mesmo que atrair sobre si a raiva dos privilegiados, tanto
do poder religioso como do poder civil.
4) Para um confronto
pessoal
4. Perguntas para a reflexão:
1. Conhece casos de
pessoas que morreram vítimas da corrupção e da dominação dos poderosos? E aqui
entre nós, na nossa comunidade e na igreja, há vítimas de desmando e de
autoritarismo?
2. Herodes, o poderoso, que
pensava ser o dono da vida e da morte do povo, era um covarde diante dos
grandes e um bajulador corrupto diante da moça. Covardia e corrupção marcavam o
exercício do poder de Herodes. Compare com o exercício do poder religioso e
civil hoje nos vários níveis da sociedade e da Igreja.
5) Oração final
Ó vós, humildes, olhai e alegrai-vos;
vós que buscais a Deus,
reanime-se o vosso coração,
porque o Senhor ouve os necessitados,
e seu povo cativo não despreza. (Sl 68, 33-34)
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